Por Adriane Nogueira Naves Perez,
Procuradora do Estado de Goiás

“Não pode o poder público ser culpado pela emergência sanitária surgida com o coronavírus”

Recentemente “ressuscitaram” o esquecido art. 486 da CLT, enunciando-se a suposta responsabilidade do Estado pelo pagamento de eventuais verbas rescisórias devidas em função da paralisação de atividades comerciais e industriais, determinada por decretos governamentais expedidos com o escopo de evitar a propagação do coronavírus.

Mas, diante da atual pandemia, será que este dispositivo de lei é mesmo aplicável?

Inicialmente, é preciso ter presente que os decretos em questão, se não forem excessivos, são lícitos, baseados tanto em recomendações da OMS quanto no dever constitucionalmente atribuído aos entes federados de proteção e defesa da saúde (CF, arts, 23, II, e 24, XII), direção do SUS (CF, art. 198) e execução de ações de vigilância sanitária e epidemiológica (CF, art. 200, II).

Segundo a jurisprudência, atos lícitos só geram o dever de indenizar quando causadores de danos anormais e específicos, isto é, a pessoas determinadas. Prejuízo generalizado, partilhado por toda a sociedade, como no caso da pandemia, cujos efeitos estão sendo suportados indistintamente por todos, não caracteriza a responsabilidade civil do Estado.

Além disso, não há falar em dever de indenizar quando se verifica a ocorrência de caso fortuito ou de força maior, conceitos que se fundamentam na inevitabilidade/invencibilidade do evento, cujas consequências são de todo inescapáveis, e, ainda, na ausência de culpa na sua produção. É precisamente a definição jurídica da pandemia.

Diferentemente, o fato do príncipe previsto no art. 486 CLT exige que ao Estado possa ser imputada a responsabilidade pela situação alheia à vontade das partes que resultou no impedimento jurídico ao exercício da atividade e, logo, no término do pacto laboral. Por óbvio não pode o poder público ser culpado pela emergência sanitária surgida com o coronavírus, típica situação de força maior, que, como dito, exclui o dever de indenizar.

Assim, é absolutamente impróprio classificar os decretos governamentais como fato do príncipe na tentativa de transferir ao Estado os ônus pelas eventuais rescisões dos contratos de trabalho. Ora, diante da grave e excepcional situação hoje vivenciada, não seria sequer razoável punir o poder público por cumprir seu impostergável mister constitucional de proteger a vida e a saúde de todos os cidadãos.

Fonte: Assessoria de Comunicação da APEG | Ampli Comunicação, com informações do jornal O Popular

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