A Nova Lei de Licitações, aprovada no ano de 2021, trouxe, além de outras diretrizes de impacto relevante nas práticas atuais, a obrigação de que os gestores e administradores de recursos públicos adotassem, com o fim de “promover um ambiente íntegro e confiável” e “racionalizar as contratações” ações de planejamento e governança.
O legislador, ciente da deficiência estrutural e da dificuldade de implementação de mudanças tão profundas, sobretudo dos milhares de pequenos municípios espalhados pelo país, adiou, para tanto, a vigência de quase totalidade de suas normas pelo generoso prazo de dois anos, prevendo sua aplicação aos processos iniciados a partir do dia 1º de abril de 2023.
Percorrido o prazo para aplicação obrigatória da nova lei, depois de acirrada cobrança por parte de cerca de 60% dos municípios brasileiros, que anunciaram a possibilidade de um verdadeiro “apagão” nas compras públicas, o governo federal confirmou, corroborando anúncio do presidente da Câmara dos Deputados, durante a 24ª Marcha a Brasília em Defesa dos Municípios, a edição de medida provisória para adiar, por mais um ano, a entrada em vigor da nova lei.
Ausência de corpo técnico, dificuldade em construir ferramentas digitais exigidas e falta de equipamentos capazes de operar o sistema foram alguns dos argumentos apresentados, repetidamente, pelos entes municipais.
A óbvia contrariedade do comportamento, depois de decorridos dois anos, ao planejamento, alçado a valor de primeira grandeza pela própria nova lei, demonstra, mais do que desídia dos entes federados, um antigo, conhecido e muito mais grave problema, entretanto: parte considerável dos municípios existentes não tem condições de sobrevivência autônoma plena e muito menos capacidade para colocar em prática os cada vez mais sofisticados e necessários instrumentos jurídicos e de gestão pública.
Discutir o assunto de demora na aplicação do novo estatuto de contratações públicas sob a égide da subjetividade, tratando o insucesso apenas como consequência da omissão desses minúsculos municípios é insuficiente, portanto.
É preciso colocar em pauta a possibilidade de fusão de municípios não sustentáveis, e, de forma urgente, aproveitar o latente debate sobre a reforma tributária para reequilibrar a repartição constitucional de receitas com o fim de permitir o enrobustecimento dos entes menores.
O verdadeiro enfrentamento precisa incluir, também, a execução conjunta, através de instrumentos jurídicos já existentes e de outros que podem ser criados de modo a permitir, por exemplo, a contratação de sistemas informatizados, bens consumíveis e patrimoniais, ou mesmo a possibilidade de atuação, através de consórcios públicos, para ações com caráter de perenidade.
Sem isso, adie-se por um, dois, ou três anos e, no final do prazo, restarão municípios não preparados para a mudança. É um verdadeiro imprevisto esperado!
Fonte: Jornal O Popular
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