1. Em relação ao Decreto n.º 9.488, de 05 de agosto de 2019, que dispõe sobre o compartilhamento de dados no âmbito da Administração Pública direta, autárquica e fundacional do Poder Executivo e empresas estatais, e o teor de notícias veiculadas na imprensa sobre suas disposições, em especial a que trata do intercâmbio de informações protegidas por sigilo fiscal entre órgãos com competência para a cobrança administrativa e judicial de créditos públicos, a Procuradoria-Geral do Estado de Goiás vem a público prestar os seguintes esclarecimentos.
2. O ato normativo em apreço surge no atual contexto de implementação de um ambiente de governança digital do Poder Executivo, onde o livre e célere tráfego de informações entre seus órgãos e entidades potencializa uma maior transparência e controle, além da eficiência de suas ações. Embora a informatização e a digitalização dos processos e atos da Administração Estadual seja uma realidade, foi constatada, por falta de uma diretriz jurídica genérica e abstrata do ente federado, a subutilização das ferramentas e recursos tecnológicos disponíveis e plenamente aptos a imprimir, com segurança, agilidade no compartilhamento de dados que venham a interessar mais de uma Pasta ou entidade descentralizada pertencentes à mesma esfera de governo.
3. Percebeu-se a presença de ilhas informacionais nas unidades administrativas do Estado, cujo compartilhamento de bases de dados infelizmente não é a regra. Tal estado de coisas é contraproducente e ineficaz, uma vez que a interlocução das redes de comunicação promoverá qualidade e pontualidade das informações. Sob a perspectiva interna, há eficiente prestação do serviço público e bom monitoramento e avaliação de desempenho, criando referenciais estratégicos ao gestor quando da veiculação das políticas públicas correspondentes. De modo externo, há harmonia informacional, efetivando-se um importante instrumento de governança pública perante o cidadão: a transparência.
4. Quanto aos dados protegidos pelo sigilo fiscal e aqueles classificados como sigilosos pela legislação, excepcionou-se, da restrição, o acesso entre a Procuradoria-Geral do Estado de Goiás e Secretaria de Estado da Economia, diante das atribuições institucionais que lhes cabem no contexto da Administração Tributária estadual para os fins do art. 198 do Código Tributário Nacional, no afã de promover o desejado incremento de receitas para o Estado de Goiás, que sofre atualmente com severa privação de recursos próprios ao ponto de ter sido decretado o estado de calamidade financeira.
5. Portanto, não procede qualquer censura que se dirija contra o permitido fluxo de informações, dados e cadastros econômico-financeiros e/ou econômico-fiscais entre os referidos órgãos pertencentes à mesma Fazenda Estadual de Goiás, já que ambos lidam, no exercício de suas competências, com “informação obtida em razão do ofício sobre a situação econômica ou financeira do sujeito passivo ou de terceiros e sobre a natureza e o estado de seus negócios ou atividades” (art. 198, caput, CTN).
6. Essa interligação orgânica e comunhão de interesses reforçam a imperiosidade de agirem, Procuradores do Estado e Auditores da Receita, em conversão de esforços e ânimo de mútua cooperação nas atividades de recuperação do crédito fiscal, concebidas como o encadeamento de atos e fases distintas (fiscalização, lançamento, constituição e cobrança) de um processo uno. Não por outra razão essa mesma possibilidade de transferência de sigilo e conseguinte dever de custódia de informações econômico-fiscais encontra-se positivada em outras unidades da Federação, como no caso do Estado de Mato Grosso, cuja norma prevê que “o compartilhamento de informações econômico-fiscais entre as unidades integrantes da Secretaria de Estado de Fazenda e da Procuradoria-Geral do Estado, que compõem a administração tributária estadual, não implica quebra de sigilo fiscal, considerando, ainda, que a custódia da informação sigilosa deverá ser transferida ao solicitante”.
7. Repele-se, por oportuno, qualquer insinuação ou interpretação enviesada que levem a crer que a troca de informações sigilosas entre a Secretaria da Economia e a Procuradoria-Geral do Estado possibilitará, no âmbito do órgão destinatário, a divulgação a terceiros ou mesmo a servidores desautorizados ou, pior, o tratamento desses dados para outro fim que não unicamente o cumprimento dos deveres funcionais aos quais seus membros e servidores estão sujeitos. Inverter essa lógica é distorcer a ordem natural das coisas e partir da premissa equivocada de que a má-fé se presume, enquanto o correto é justamente o contrário. Com efeito, o compartilhamento das informações acobertadas pelo sigilo fiscal implica a transferência, ao órgão receptor, do dever de continuar preservando o sigilo e o empregando para a finalidade para o qual foi instituído, convindo ressaltar, em reforço à prevenção contra ilegalidades, afora as implicações de cunho disciplinar, que tal bem jurídico é também tutelado por norma penal (art. 325 do Código Penal).
8. Por fim, sobre o aspecto formal, o numerado decreto (9.488/19) representa uma lídima produção normativa da qual o Governador do Estado pode se valer no ofício de dirigente superior da Administração Estadual, inclusive com certo grau de inovação no ordenamento jurídico, já que a Constituição do Estado (art. 37, XVIII, “a”), em simetria com a Constituição da República (art. 84, VI, “a”), defere a ele o dever-poder de ordenar a atuação interna de seus órgãos com o intuito de conferir racionalidade e eficiência no desempenho de suas funções.
9. As considerações tecidas acima sobre os propósitos que embasaram a edição do decreto não deixam a menor dúvida de que o Chefe do Poder Executivo elegeu o tipo normativo adequado para a finalidade visada, que pode ser traduzida na atuação sinérgica e coordenada dos órgãos e entidades integrantes da Administração Estadual de Goiás na troca de informações, notadamente entre os órgãos incumbidos da recuperação dos ativos fiscais que sustentarão as atividades financeiras da unidade federada e a execução das políticas públicas a seu cargo. Como o decreto autônomo em apreço não implica aumento de despesa nem cria ou extingue órgãos públicos; ao contrário, organiza e otimiza o funcionamento da máquina pública com vistas a incrementar o ingresso de receitas, de modo a prevenir a dispersão de esforços e recursos (humanos, materiais e financeiros) para finalidades idênticas ou afins, é inquestionável sua juridicidade, seja sob uma perspectiva legal ou constitucional.
Fonte: PGE
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