A discussão sobre o recebimento de honorários de sucumbência por procuradores estaduais está longe de ser novidade, mas o tema volta a ganhar destaque após Raquel Dodge ter ajuizado, há alguns dias, 21 ações no Supremo Tribunal Federal (STF) questionando leis estaduais que autorizam o recebimento desses valores por advogados públicos
A Associação Nacional de Procuradores Estaduais (Anape) saiu em defesa da classe, dizendo que procuradores são, “antes de qualquer coisa”, advogados – portanto se submetem às mesmas regras da advocacia privada. Em entrevista ao JOTA, o presidente da entidade, Telmo Lemos Filho (foto), diz que os honorários são verbas privadas e, por isso, não podem ser consideradas como verba remuneratória, como alega a PGR.
O tema chegou ao Supremo pela primeira vez em dezembro do ano passado, quando a PGR, em ação direta de inconstitucionalidade, alegou que alguns dispositivos da Lei Federal 13.327/2016 ferem a Constituição ao permitir que membros da advocacia geral da União recebam honorários quando vencem um processo judicial. A chefe do MPF também contestou, na ocasião, parágrafo 19 do artigo 85 do Código de Processo Civil de 2015, que prevê o benefício para advogados públicos.
Agora, os alvos são as leis de 15 estados e do Distrito Federal que disciplinam o tema. Algumas dessas leis são da década de 1980, portanto, o recebimento de honorários de sucumbência por advogados públicos é regra vigente há décadas na maior parte do país.
Por isso, para o presidente da Anape, há “tranquilidade” quanto ao tema, pois ele já é pacificado tanto nas casas legislativas federais quanto nas estaduais. A entidade pedirá para ingressar como amicus curiae nas ações no STF.
“Esse debate foi feito no local próprio pra ser feito. Foi feito no Congresso Nacional, quando se fez o estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil, quando foi feito o CPC em 2015, quando foi feita a lei que disciplina o tema na União, e foi feito também nas assembleias legislativas estaduais, então há uma deliberação da sociedade brasileira pelos seus representantes no sentido de que isso é uma verba legítima para advogados públicos”, opina Lemos Filho.
Para a PGR, porém, os honorários para advogados públicos “têm caráter remuneratório” de contraprestação de serviços prestados no curso do processo. Na visão do órgão, como esses serviços são executados e recolhidos pelo ente público, devem ser integrados à receita pública. “Não podem ser classificados, em hipótese alguma, como receita de índole privada, dada a manifesta incompatibilidade com o regime estabelecido em lei para seu recolhimento e distribuição”, diz a PGR nas ações ADIs e ADPFs ajuizadas no Supremo.
A PGR alega que, como se tratam de agentes públicos, “para que gratificação ou adicional pecuniário seja legitimamente percebido, faz-se necessário que não decorra de trabalho normal, mas possua fundamento no desempenho de atividades extraordinárias, que não constituam atribuições regulares desempenhadas pelo agente público”.
O presidente da Anape diz que, como os advogados públicos são regidos pelas normas do Estatuto da Advocacia da OAB, têm os mesmos direitos que os advogados privados. “Os procuradores são advogados antes de qualquer coisa e nós temos isso como central. Nós somos advogados, obrigatoriamente inscritos na OAB e entendemos que tem que ser assim. O nosso estatuto nacional é o estatuto da Ordem, onde temos todas as vedações e prerrogativas da advocacia”, diz.
Após o ajuizamento das ações por Dodge, a OAB chegou a divulgar nota em defesa da manutenção dos honorários de sucumbência para advogados públicos. Para a OAB, não há inconstitucionalidade pois “não se extrai da Constituição Federal qualquer diferenciação entre a advocacia pública e privada, quanto aos honorários de sucumbência, de modo que a unidade da Advocacia foi claramente corroborada pelo Estatuto da OAB, que sujeita os advogados públicos ao seu regime profissional, além daquele próprio que lhe seja complementar, mas jamais excludente”.
Telmo diz ainda que a proposta da PGR de que os honorários devam ir para os estados não poderia ser executada, pois é uma verba de caráter privada. “Ela não poderia ir para os cofres públicos, ela não faz parte da arrecadação dos estados, não é fruto de nenhum tributo”, diz, e ainda defende que não é uma verba remuneratória pois “é variável, e passa por rateio entre os procuradores estaduais”.
São, ao todo, 19 ações diretas de inconstitucionalidade e 2 arguições de descumprimentos de preceito fundamental, contra leis do Acre, Amapá, Amazonas, Bahia, Ceará, Distrito Federal, Goiás, Maranhão, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Pará, Paraíba, Paraná, Pernambuco, Piauí, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, São Paulo, Sergipe, Tocantins.
As ações foram distribuídas a relatores distintos, sendo a maior parte de relatoria da ministra Rosa Weber e em muitas delas já foram pedidas manifestações dos Estados.
Para a Anape, há grandes esperanças de que o STF mantenha a percepção dos honorários de sucumbência em todo o país, pois diz que já é tema pacificado nos estados e na União. “São praticamente todos os estados, todo mundo errou? Todos os estados regularam uma matéria que não poderiam regular? É uma questão até de ordem federativa, os estados entenderam por fazer assim, e qualquer decisão que venha ser adotada, seria também uma violação à própria autonomia federativa”, argumenta.
Fonte: Portal Jota
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